ANTOLOGIA POESIA PALESTINA MODERNA (XII), por André Da Ponte

ANTOLOGIA POESIA PALESTINA MODERNA (XII), por André Da Ponte

ANTOLOGIA POESIA PALESTINA MODERNA (XII)

Moin Tawfiq Bisisu

معين بسيسو

Eu, Tu, Ele

No seu vocabulário não havia árvores

nem flores…

Não havia pássaros no seu vocabulário.

Só sabia o que lhe ensinaram:

matar pássaros

e dous pássaros matou,

odiar à lua

e à lua odiou,

ter coração de pedra

e um coração de pedra teve,

a berrar: “Viva o que seja!”

“Abaixo o que seja!”

“Morra o que seja!”

No seu vocabulário não havia árvores,

no seu vocabulário não havia

nem eu nem tu

pois tinha de matarnos

a mim e a ti.

Só sabia o que

lhe ensinadaram:

matarnos a mim e a ti.

Para uma turista americana

Após a Guerra dos Seis Dias – 1967

Poupe, senhora,

mas você apareceu quando

a mão do poeta fora cortada.

Que é o que há para vender no Leste?

Vendemos nós a uma turista velha

que chegara antes

o sepulcro de Saladino e a cidade de Hittim14.

Vendemos os jardins de Babilônia

nos mercados do mundo,

flor a flor e rebento a rebento.

E fizemos liquidação de dedos e anéis.

Apenas nos restam as Pirâmides,

mas são bem pesadas as suas pedras!

E a esfinge está ferida,

e há morrer se a tiramos fora desta terra,

ou se é que da sua frente não arranca o cuitelo*.

Perdoe, senhora, vendemos já o último ataúde,

atiramos no rio o último tinteiro

e temos degolado o último galo que cantava.

Não nos resta mais que Deus,

que foge para qualquer parte

como gazela perseguida por cães da partida.

A contrafracção dá-lhe caça

com o seu bom cavalo.

Perseguiremo-lo por toda parte

e o pilharemos para você.

Senhora, quem vendeu ao poeta também venderá Deus.

http://www.alnaked-aliraqi.net/files/2014/06/maein-2-269×300.jpg

14 Lugar da Palestina onde Saladino em 1187 venceu aos cruzados e se tornou o prelúdio da reconquista de Jerusalém.

ANTOLOGIA POESIA PALESTINA MODERNA (XI), por André Da Ponte

ANTOLOGIA POESIA PALESTINA MODERNA (XI), por André Da Ponte

ANTOLOGIA POESIA PALESTINA MODERNA (XI)

Moin Tawfiq Bisisu

معين بسيسو

 

Moin Bisisu nasceu em 1930 em Gaza. Após a implantação em 1948 do Estado israelense foi obrigado a escapar da Palestina para O Cairo onde estuda na Universidade Americana e depois para Bagdade. Membro muito activo do Partido Comunista, nunca renunciou às ideias dum mundo melhor e pola sua actividade política esteve encarcerado em Egipto entre 1955 e 1958 e, de novo, entre 1959 e 1962. Em 1953 volta para a Gaza por tempo muito breve. Uma peregrinação nos anos sessenta levá-lo-á desde O Cairo para Beirute, Damasco, Moscovo e de novo a Beirute onde residirá em começos de 1970 até 1982. Lá desenvolverá uma intensa actividade política e cultural (a editorial Dar al-Awda editará em dous volumes as suas Obras Completas e o mesmo fizera a direcção da versão árabe da revista Lótus) até a invasão sionista do Líbano em 1982. Durante o cerco à cidade escreve alguns dos mais intensos poemas, alguns deles mesmo em colaboração com outro grande poeta resistente: Makhmud Darwish. Foi, durante um tempo, responsável dos assuntos culturais da Secretaria da União Geral de Escritores Palestinos e membro do Conselho Nacional Palestino. Tem de partir para a Tunísia com o resto dos combatentes palestinos e mais tarde para a Alemanha Democrática e a Grã-Bretanha. Proposto candidato para embaixador da OLP em Moscovo, não chegou a ocupar o posto desde que morreu dum ataque de coração no Hotel Intercontinental da capital britânica em 25 de Janeiro de 1984.

Considerado pola* crítica como um dos mais inspirados poetas palestinos, recebe em 1981 a distinção Lótus da União dos Escritores Afro-asiáticos polos seus méritos literários.

Entre as suas obras há que salientar: Filastin fi al-Qalb (Palestina no coração, 1960), al-Ashjar Tamut Waqifah (as árvores morrem de pé, 1966), Ma‘sat Ernest Guevara (a tragédia de Ernesto Guevara, 1969), al-Zinj Thawrat (a revolta dos negros, 1970), Shamshun wa Dalila (Sansão e Dalila, 1971), Difa‘n ‘an al-Batal (na defesa do herói, 1975) e al-Na Khudhi Jadasi Kisa ´n min Raml (Agora, toma o meu corpo como um saco de areia, 1976).

 

Três muros para a câmara da tortura

 

À alva

Resistirei…

enquanto haja no muro uma página branca

e não se derretam os dedos da minha mão.

Alguém bate aqui

uma mensagem através do muro.

Os fios converteram-se em veias nossas,

as veias destes muros.

O nosso sangue verte-se todo

nas veias destes muros…

Uma mensagem através do muro:

Eles fecharam uma cela,

mataram um prisioneiro.

Abriram uma cela,

levaram um prisioneiro…

Ao meio-dia

Pusseram-me diante um papel,

pusseram-me diante um lápis,

meteram-me na mão a chave da minha casa.

O papel que quiseram lixar

disse: Resiste!

O lápis cuja frente quiseram desonrar

disse: Resiste!

A chave da minha casa disse:

em nome da cada pedra

da tua humilde morada, Resiste!

Um golpe no muro

é a mensagem duma mão quebrada

que disse: Resiste!

E a chuva cai

gotejando no teito* da cela de torturas.

Cada pinga brada: Resiste!

Ao pôr-do-sol

Ninguém está comigo,

ninguém escuita* a voz deste homem,

ninguém o vê.

Cada noite, quando os valos

e as portas se fecham…

sai das minhas sangrentas feridas

e caminha pola* minha cela.

Sou eu.

É como eu.

Vejo-o de meninho*

e de vinte anos.

É o meu consolo,

o meu único amor.

É a carta que cada noite escrevo

e o selo para o largo mundo

e um pequeno país.

Olhei-o esta noite

saindo das minhas feridas

melancólico, torturado, triste,

caminhando em silêncio, sem nada contar,

como se dissesse:

não volverás ver-me se confessas,

Se escreves…

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