VALADO

Quero ser valado forte

                           contra o que baten os desexos,

   contra o que se esnaquizan

            as envexas e as xenreiras,

                               ser muro de pedra rexa,

     para non deixar entrar

                                  odios nin penas…

    Aínda que as fendas, son fondas

e mancan…

                         Quero non sentir… que sinto,

e que non me manquen as verbas

                                      no corazón adormecido.

Sinto que na pel espida, xa non dorme o medo,

o vento do inverno levou a tristura

                                   moi lonxe,

veñen tempos novos, na outra banda do valado

           nascen as rosas..  nos campos arrasados

polo medo

onde a herba murcha ficaba,

agora medra verde, e louzá,

                         verde coma a esperanza

que aniña moi preto do corazón,

aquí… ó outro lado do valado.

 

O SOLTEIRÃO de Leopoldo Lugones (versión galega de André Da Ponte)

O SOLTEIRÃO de Leopoldo Lugones (versión galega de André Da Ponte)

Das minhas traduções

UM POEMA DE LEOPOLDO LUGONES TRADUZIDO PARA O GALEGO DUMA EDIÇÃO DE JORGE LUÍS BORGES.

 

Leopoldo Lugones é um dos mais celebrados poetas que tem dado a literatura argentina e ainda toda  a literatura escrita em língua castelhana no século XX.

Apanho o poema que vai abaixo da edição “Leopoldo Lugones. Antología Poética. Prólogo y selección de Jorge Luís Borges”, Alianza Editorial, Madrid, 1982, páginas 23-28.

Do prólogo de Borges destaco : “Nasceu em 1874, numa vila da província mediterrânea de Córdoba; em 1938 suicidou-se numa das ilhas do Tigre, esse intrincado e verde arquipélago que se estende ao noroeste da cidade de Buenos Aires. Os seus antepassados foram conquistadores asturianos e militares da nossa Guerra da Independência […] Criou-se no campo, que conheceu e amou minuciosamente. Aos vinte anos, cursados já os seus estudos universitários, foi para Buenos Aires, que lhe daria o que talvez lhe faltara: o diálogo filosófico e literário. No Ateneu tivo amizade com Dario (Rubén Dario). Filiado ao partido socialista, publicou violentos artigos em A Montanha, que derivou o seu nome duma das bandeiras estremas da Revolução Francesa. Foi companheiro de José Ingenieros, de Justo B. Justo e de Macedonio Fernández. Em 1897 deu ao prelo o seu primeiro livro de versos As montanhas do ouro, onde advertimos a influência de Hugo (Vitor Hugo) e, quiçá, de Almafuerte. Este, facilmente iracundo, não agradeceu essa proba de admiração e dixo: «Lugones quer rugir, mas não pode. É um Almafuerte para senhoras».Foi professor de literatura no Colégio Nacional e, depois, ouvidor de escolas. Desde 1914, dirigiu em Paris a Revue Sud-Américaine. Professou entre outros o amor da Grécia e o amor da França. Sempre lhe interessou a teosofia, cuja influência é notável nos seus dous livros de relatos As forças estranhas (1906) e Contos fatais (1924), mas converteu-se, nos seus últimos anos, à fé católica, da que antes abominara. Foi diretor da Biblioteca do Mestre. Colaborava com regularidade em La Nación onde conheceu um dos seus contados amigos íntimos, Alberto Gerchunoff. Outro foi o poeta menor Luís Maria Jordán. Fundou e presidiu a Sociedade Argentina de Escritores. Eu estava inimizado com ele; muito generosamente me incluiu na listagem dos vogais.

Louvara-se sempre ser o marido mais fiel de Buenos Aires. A consciência duma infidelidade o levou, contam, à decisão do suicídio. Esta causa não pode ter sido a única. Nunca uma causa é única. Num quarto dum hotel do Tigre, que ainda se mostra aos curiosos, tomou num sol-pôr do ano 1938, uma dose de cianuro. Não tivo tempo de repor o copo na mesa; o copo fixo-se anacos. Muito antes escrevera: «Dono o homem da sua vida,também o é da sua morte». Este conceito é de índole pagã; podemos lembrar a Petrônio, a Sêneca e a Mishima.

[…]

Um poeta não só é um artífice, alguém que faz, embora um homem que sente com intensidade e complexidade. Para Lugones, o descobrimento dum livro ou dum estilo foi uma experiência não menos capital que as outras que teceram a sua vida.

[…]

A obra de Lugones é uma das máximas aventuras do castelhano.

 

NOTA MINHA.- Tentei, ao traduzir o poema, manter, dentro do possível, as rimas consoantes e a musicalidade do verso. Poucas vezes pude consegui-lo. Onde não foi possível substitui as rimas ricas por assoantes e, às vezes, por ecos de rimas. Espero que o leitor saiba me perdoar estes deslizes da minha fraqueza.

Sempre agradecido.

 

O SOLTEIRÃO

 

I

 

Longas brumas violetas

Flutuam no rio gris,

E além nas docas quietas

Sonham escuras goletas

Com um longínquo país.

 

O arraial solitário

Tem a noitinha a seus pés,

E trema o seu campanário

Como vapor visionário

Desse desenho holandês.

 

O crepúsculo perplexo

Entra a uma alcova glacial,

Em cujo embaçado espelho

Com esquivado reflexo

Turva a água do cristal.

 

O leito branco se gela

Junto ao sinistro baú,

Na tachola enferrujada

a aguarela avelhantada

Quadrada de felpo azul.

 

No cabide do armário,

O crucificado frac

Exala um fenol severo,

E sobre o largo tinteiro

Pensa um busto de Balzac.

 

A brisa que vem das campas,

Com alento de malvela,

Abala teias de aranha

Que são imensas pestanas

Da desusada cancela.

 

Lá, entre as nuvens rosas

Atrás vão as andorinhas

De invisíveis mariposas,

Traçam letras misteriosas

Como dando despedidas.

 

E na alcova solitária,

Sobre um coçado sofá

Duma seda centenária,

Junto a sua estufa  precária

Meditando um home ´stá.

 

Deitado em postura inerte

Masca sua pipa de evónimo.

E naquela calma adverte

O que perto está a morte

Do silêncio do relógio!

 

Na sua garganta resseca

Grunhe uma biliosa fez,

E sob a sua frente oca

A verde e negra enxaqueca

Manobra um longo xadrez.

 

Nem gorjeio de alegrias!

Nem clamor de tempestade!

Como nas covas sombrias,

Lá no fundo de seus dias

Boceja uma soidade.

 

E com desmaios estranhos,

Na sua confusa visão

De insípidos desenganos,

Vê chegar os grandes anos

Com suas cargas de algodão.

 

II

 

A inverosímil distância

Há um violino no meio,

Ressuscitando na estância

Como uma ancestral fragrância

Do fumo daquele tédio.

 

E o homem pensa. A sua vista

Lembra das rosas em flor

Dum sombreiro de estilista…,

Aquele pano de batista…,

Nas travessas…, e no cós…

 

E o duelo em praia deserta:

Um…, dous…, três…E o esplender

Duma montada pistola…

E o som grave da onda

Convidando a bem morrer.

 

E ao dar à criança inquieta

A reconquistada flor

Pola persiana discreta,

Sentiu-se herói e poeta

Por uma graça do amor.

 

Epitalâmios de flores

A dita escreveu a dois,

E assim nas tardes de cores

Souberam desses amores

Celestiais… E depois…

 

Agora uma vaga espinha

Lhe punça no coração,

Se sua coquete vizinha

Tira a sua breve botinha

Polos ferros do balcão;

 

E se com voz pura e tersa,

A garota do arraial

Na sua malícia perversa,

Temas picantes conversa

Com o canário jovial;

 

Surge no triste percalço

Dessa tragédia banal:

A noiva…, a flor…, o lanço…,

Vinte anos conta o romanço.

Turgueniev tem um tal qual.

 

Que triste era a sua mirada,

Que iluminada a sua fé

E que leve a sua pisada!

Porque a deixou olvidada?

Se já não sabe o porquê!

 

III

 

Lá no desolado rio

Grisa-se o tom ponçó

Do crepúsculo sombrio,

Como um imperial fastio

Sobre um outono de gró.

 

E o homem medita. É ela

A visão triste que tinha

De remoto nimbo saída;

Uma estragada donzela

Que lhe está aguardando ainda..

 

Vago pavor lhe amedronta,

Vai escrever-lhe por fim

Desde o nirvana que enfronta…

A carta sairá pronta

E na carta irá um jasmim.

 

A pluma em seus dedos pega;

Já a folha tem a doblez;

Sua alma no azul navega.

Em vinte anos de brega

Escreverá “teu” outra vez.

 

Não será trunca n´ambígua

Sua confidência de amor

Sobre esta vitela exígua.

Se essa carta é muito antiga!…

Já está turvo o borrão.

 

Terá seu deleite louco,

Brancas sedas de amizade

Pra esconder seu ígneo fogo.

E a gente rirá um pouco

Desses noivos doutra idade.

 

Ela, a velhinha em seu leve

Candor de virgem senil,

Será um alabastro breve.

Sua aristocracia de neve

Nevará um tardio abril.

 

As suas cãs, paz suprema,

Pola alcova sororal

Darão odor de alfazema,

E estará na suave gema

Do fino dedo o dedal.

 

Cochichará rás do solo

Sua enágua um vago fru-fru,

E com afável consolo

Acolherá no veludo

Sua elegância de bambu!…

 

Assim vai o homem sonhando

Dentro do aposento aquel,

E o seu sonho é doce e brando;

Mas a noite vai chegando

E ainda está branco o papel.

 

Sobre a sua visão de aurora,

Um tenebroso crespão

Os contornos descolora,

Pois a noite vencedora

Se lhe entrou no coração.

 

E como enturvada espuma,

Uma ideia triste vai

Emergindo da sua bruma:

Que bolorenta está a pluma!

A pluma n´escreve já!

 

 

http://k46.kn3.net/taringa/0/5/5/2/C/B/matacristo/7FF.jpg

O LAGO de Alphonse De Lamartine.

O LAGO de Alphonse De Lamartine.

Das minhas traduções

 

O POEMA “O LAGO” DE ALPHONSE DE LAMARTINE TRADUZIDO PARA O GALEGO  E UMA NOTA SOBRE O POEMA.

  

É perto do lago de Bourget, na Saboia, que Lamartine escreveu este célebre poema, uma das obras mestras da literatura em francês e ainda de toda a literatura universal.

 Julie Charles, esposa do célebre físico Jacques Charles (Beaugency, Orléanais, hoje Loiret, 12 de novembro de 1746 – Paris, 7 de abril de 1823), devia se juntar com o poeta em agosto de 1817 no Lago de Bourget, lugar de múltiplos encontros entre os dous amantes, mas a enfermidade dela reteve-a em Paris, onde viu a morrer em dezembro do mesmo ano vitimada pola tísica pulmonar.

 No seu Comentário ao poema, Lamartine fez alusão à música que Niedermeyer (Abraham-Louis de Niedermeyer d’Altenburg, nascido em Nyon, Suíça, 27 de abril de 1802 e morto em 14 de março de 1861 em Paris) compôs sobre Le Lac: “Sempre pensei que a música e a poesia nutriam-se se associando. Ambas são artes completas: A música leva consigo o seu sentimento; os belos versos portam com eles a sua melodia.”

 Os críticos franceses concordam que é, junto com Tristesse d’Olympio de Victor Hugo e Souvenir de Alfred de Musset, o mais belo poema que se tem escrito por autores galos no século XIX.

 

O LAGO

Assim, empurrados sempre para novas ourelas,

Na eterna noite, sem retorno, levados,

Nunca poderemos no oceano dos tempos

deixar um só dia os esteios ancorados?

 

Ó lago!, o ano se tem cumprido apenas,

E estou cá solitário. Suas pegadas

não voltarão deixar nas tuas areias

A que desta rocha, ainda ontem, sereias

Deitou em ti as suas olhadas!

 

E assim como agora, então ressoavas;

Mugindo vais como naqueles dias,

Contra estas penas o teu furor desbravas,

E com a branca espuma o mesmo musgo lavas

Onde os seus pés lambias.

 

Uma tarde, te lembras? Em enlevo supremo

Íamos ela e eu, em silêncio bogando,

E sob o céu azul, de um a outro extremo,

Mas tão só se escuitava o bater do remo

nas ondas cadenciando.

 

E foi que de repente aquele mudo vento

Cativou encantado uma voz divina;

Nunca ninguém sonhara um tão tal doce acento

na água cristalina:

 

“Ó tempo! Suspende tua carreira,

Não quebres nosso enlevo,

Tu, tempo voador.

Deixa-nos gozar por sempre

os mágicos instantes

que cá brinda o amor.

 

“Quantos infelizes cá baixo não te imploram

No teu correr fugaz;;

Toma com os seus dias os seus que os devoram;

Deixa o ditoso em paz.

 

“Mas eu demando em vão que nesta mansa noite

lento mova seu pé;

As estrelas já rodam e no oriente pálido

A aurora já se vê.

 

“Amemos, pois, amemos na hora fugitiva,

Apressados gozemos!

Nem tem o homem porto nem o tempo ribeira;

Que flua e nos passemos!”

 

Por enquanto o mal acerbo dura,

O tempo que à sua vista se adormece,

A roubar-nos a dita se apressura

E o momento que encerra mais doçura,

Fuje e desaparece.

 

E nunca há de voltar o que é passado?

Tudo quanto se foi ficou perdido,

E para sempre o sepulta o fado

Em mudo seio, trás alto valado,

Em sempiterno olvido?

 

Nem ainda guardaremos suas pegadas?

Para onde vão as delícias que devoras,

Que fazeis Eternidade, sombras abismadas,

das deglutidas horas?

 

Ó lago! rochas mudas! covas! selva escura!

Perdoa-vos o tempo ou talvez

Beleza vos torna, a fermosura

Dessa noite guardai. Salva, ó Natura,

Sua lembrança sequer!

 

Perene é o recordo, ó lago,

Em teu recinto, nas suaves frondas

Que te envolvem com ridente afago,

Nestas rochas que com turvo âmago

Colgam sobre tuas ondas!

 

Que seja no zéfiro que treme e que passa,

Nas copas sussurrantes que as folhas humilha,

E na argêntea lua que branqueja sua cara

E que no éter brilha.

 

Que o vento que geme, a roseira que suspira,

Que os perfumes leves que os ares ambientaram,

Quanto aqui se senta, se veja ou se respira,

Tudo diga: eles se amaram!

 

Alphonse de Lamartine (Mâcon, 21 de outubro de 1790 – Paris, 28 de fevereiro de 1869)

 

[Tradução do texto em francês recolhido em “Lamartin. Chefs-d´oeuvre poétiques”, Librairie A. Hatier, Paris, s/d, páginas 13-15]

 

Le Lac

Ainsi, toujours poussés vers de nouveaux rivages,

Dans la nuit éternelle emportés sans retour,

Ne pourrons-nous jamais sur l’océan des âges

Jeter l’ancre un seul jour ?

 

Ô lac ! l’année à peine a fini sa carrière,

Et près des flots chéris qu’elle devait revoir,

Regarde ! je viens seul m’asseoir sur cette pierre

Où tu la vis s’asseoir !

 

Tu mugissais ainsi sous ces roches profondes,

Ainsi tu te brisais sur leurs flancs déchirés,

Ainsi le vent jetait l’écume de tes ondes

Sur ses pieds adorés.

 

Un soir, t’en souvient-il ? nous voguions en silence ;

On n’entendait au loin, sur l’onde et sous les cieux,

Que le bruit des rameurs qui frappaient en cadence

Tes flots harmonieux.

 

Tout à coup des accents inconnus à la terre

Du rivage charmé frappèrent les échos ;

Le flot fut attentif, et la voix qui m’est chère

Laissa tomber ces mots :

 

” Ô temps ! suspends ton vol, et vous, heures propices !

Suspendez votre cours :

Laissez-nous savourer les rapides délices

Des plus beaux de nos jours !

 

” Assez de malheureux ici-bas vous implorent,

Coulez, coulez pour eux ;

Prenez avec leurs jours les soins qui les dévorent ;

Oubliez les heureux.

 

” Mais je demande en vain quelques moments encore,

Le temps m’échappe et fuit ;

Je dis à cette nuit : Sois plus lente ; et l’aurore

Va dissiper la nuit.

 

” Aimons donc, aimons donc ! de l’heure fugitive,

Hâtons-nous, jouissons !

L’homme n’a point de port, le temps n’a point de rive ;

Il coule, et nous passons ! “

 

Temps jaloux, se peut-il que ces moments d’ivresse,

Où l’amour à longs flots nous verse le bonheur,

S’envolent loin de nous de la même vitesse

Que les jours de malheur ?

 

Eh quoi ! n’en pourrons-nous fixer au moins la trace ?

Quoi ! passés pour jamais ! quoi ! tout entiers perdus !

Ce temps qui les donna, ce temps qui les efface,

Ne nous les rendra plus !

 

Éternité, néant, passé, sombres abîmes,

Que faites-vous des jours que vous engloutissez ?

Parlez : nous rendrez-vous ces extases sublimes

Que vous nous ravissez ?

 

Ô lac ! rochers muets ! grottes ! forêt obscure !

Vous, que le temps épargne ou qu’il peut rajeunir,

Gardez de cette nuit, gardez, belle nature,

Au moins le souvenir !

 

Qu’il soit dans ton repos, qu’il soit dans tes orages,

Beau lac, et dans l’aspect de tes riants coteaux,

Et dans ces noirs sapins, et dans ces rocs sauvages

Qui pendent sur tes eaux.

 

Qu’il soit dans le zéphyr qui frémit et qui passe,

Dans les bruits de tes bords par tes bords répétés,

Dans l’astre au front d’argent qui blanchit ta surface

De ses molles clartés.

 

Que le vent qui gémit, le roseau qui soupire,

Que les parfums légers de ton air embaumé,

Que tout ce qu’on entend, l’on voit ou l’on respire,

Tout dise : Ils ont aimé !

 

 

O LAGO DU BOURGET CANTADO POLO POETA.

 

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/2/28/Lac_du_Bourget_%26_cha%C3%AEne_de_Belledonne.JPG/800px-Lac_du_Bourget_%26_cha%C3%AEne_de_Belledonne.JPG

 

OS DOZE de Aleksandr Aleksandrovitch Blok (tradución ao galego)

OS DOZE de Aleksandr Aleksandrovitch Blok (tradución ao galego)

DAS MINHAS TRADUÇÕES.

Aleksandr Aleksandrovitch Blok (em russo Алекса́ндр Алекса́ндрович Блок; Pretogrado, 28 de novembro (calendário juliano) de 1880 – 7 de agosto de 1921), foi um dos mais talentosos poetas russos após Aleksandr Pushkin.

Pertenceu a uma família de intelectuais (o pai do poeta foi professor de Direito na Universidade de Varsovia e a avó materna foi reitora da Universidade Estatal de Petrogrado).

Após a separação dos seus pais, Blok foi viver com parentes na mansão de Shakhmatovo, perto de Moscovo. Foi na biblioteca dessa casa onde descobriu a filosofia de Vladimir Soloviov e leu aos poetas Fiodor Tiutchev e Afanasi Fet que guiaram as suas obras iniciais que depois foram compiladas sob o título de “Ante Lucem”.

Em 1903 casou com Liubov Dimitrievna Mendeleeva, filha do genial químico Dmitri Mendeleev (o descobridor da Tabela Periódica dos Elementos Químicos). Foi ela, à sua esposa, a quem lhe dedicou um poemário que obtivo grande fama: “Versos para a bela senhora” (em ruso, Стихи о Прекрасной Даме)

Os livros de poemas como “A Cidade”(Город, 1904-1908), “Máscara de neve”(Снежная маска, 1907), fixeram que fosse comparado – um bocado exageradamente, todo há que dizê-lo – com Aleksandr Pushkin e a sua época fosse chamada de Era de Prata da poesia russa.

Aleksandr Blok viu expressar a Revolução de Outubro no poema que traduzo a seguir: “Os doze” (Двенадцать, 1918), onde faz a descripção de doze soldados bolcheviques à semelhança dos doze apóstolos, que avançam nas ruas de Petrogrado enquanto se abate sobre eles uma feroz nevasca.

 

O poema usa dos ritmos das cantigas populares russas misturando-os com ritmos psalmôdicos da Igreja Ortodoxa o que confere ao poema uma elegante e a par grandiosa atmósfera envolvente.

 

O poeta líder dos simbolistas russos está enterrado no Cemetério de Volkovo, em São Petersburgo, ao lado de personalidades como Leonid Andreiev, Ivan Goncharov, Ivan Turgueniev, Isaak Brodski, Dmitri Mendeleiev, Ivan Pavlov e Gueorgui Plekhanov, entre outros muitos.

 
OS DOZE

I

Entardecer negro.

Branca neve.

Vento, vento!

Um homem não pode, de pé, sustentar-se,

Vento, vento!

Que vai polo mundo de Deus todo inteiro!

Redemoinha o vento

a branca neve.

Há geo sob a neve leve.

Esbarrão. Um brado.

Quem a andar se atreve

escorre na rua… Ai, que pobrezinho!

Entre duas casas frente a frente,

deitada há uma corda;

na corda, um cartaz;

Todo o poder para as Constituintes”

Lagrimeja uma velha e não replica.

Não entende o que isso significa.

Para que tão grande cartaz?

Que enorme tela!

Quantas saias poderiam se fazer com ela!

E os pés às crianças se lhes congelam…

assustadíssima, a velha

salta um monte de neve como galinha que espreita.

  • Ai, Virgem Santíssima!
  • Ai, estes bolcheviques o ataude nos botam!

Vento que talha como gadanhas.

Frio ao compasso de tudo isso.

Um burguês em cruze de duas ruas,

mete o nariz no pescoço.

Quem é este? Grenhas longas.

A sua voz se aletarga:

-Traidores! Que horror!

  • Morreu a Rússia sem decoro!

Seguramente um escritor,

um bico de ouro.

E eis, um homem que de saias viste,

oculta-se na neve que lhe faz de topo.

Porque hoje andas triste,

camarada pope?

Lembras-te como antes

ias de pança adiantada,

e a cruz encima, tornava brilhante

a barriga inchada?

Uma dama de astracã caracolada

achega-se outra, apenada,

-Quanto temos chorado, chorado…

Cai resvalando,

e – pum! – fica tumbada.

Ai1 Ai!

Dá-me a mão, carai!

O alegre vento

alegra-se cruel,

move as longas saias,

sega quem transita.

Racha, abala, agita

esse grande cartaz:

Todo o poder para as Constituintes”

e estas frases clama:

também se reuniram as nossas gentes…

no local de enfrente…

Discutimos,

resolvemos:

Por um tempo, dez rublos; por dormida, vinte pedir.

E de ninguém receber menos…

vamos dormir…

A tarde caindo.

A gente acovilha-se.

Apenas um vagabundo

os ombros encolhe.

Assobios do vento…

Ei, pobretão, trota mundos!

Vem para a minha casa,

nos abraçaremos…

Pão!

Que espera quem se atrasa?

Passa!

Negros, negros os céus estão.

Ânimo irado, triste raiva, raiva.

O peito se abrassa.

Raiva negra, santa raiva, fúria.

Camarada, vigila sem taxa

de quatro olhos!

 

II

Passeia o vento, a neve voa.

Os doze homens andam em vela.

Negras correagens dos fuziles,

e em volta deles há a milhares luzes.

Entre os dentes, um cigarrinho;

marca merecem levar os patifes.

Liberdade, liberdade.

Ai, ai, sem cruz ao peito vão!

Tra-ta-ta!

Frio faz, camarada, frio já!

  • Com Katka está Vanhka numa má taberna.
  • Dinheiro no carpim leva numa carteira.
  • Vaniuska já é rico, tinha-o sonhado.
  • Era dos nossos, tornou-se agora soldado.
  • Ai, Vanhka, burguês, ai, filho de cadela,

se a mim Katka beijas, o baque não erra!

Liberdade, liberdade.

Ai, ai, sem cruz ao peito vão!

Katka com Vanhka ocupada está,

Em quê minha querida ocupada estará!

Tra-ta-ta!

E em volta há luzes a milhares…

Nos ombros, correagens de fuzis…

Mais forte o teu passo revolucionário,

que está o inimigo perto e temerário!

Aguenta, camarada, o teu fuzil sem medo.

À Santa Rússia uma bala lancemos,

a do passado,

à das isbas, a esse que chamamos

de cu pesado.

Ai, ai, sem cruz ao peito vão!

 

III

Assim foram os nossos rapazes

para servir na guarda vermelha,

para servir na guarda vermelha,

e perder as suas cabeças loucas.

Ai, tu, pena em cadeia,

doce vida que tiro;

desgarrada guerreira,

fuzil austríaco!

Para os burgueses podam todos penarem,

o fogo do mundo vamos soprar,

Incêndio do mundo que em sangue nasceu,

Dá-nos, Senhor, a tua benção!

 

IV

Redemoinhos de neve, grita o cocheiro,

Vanhka com Katka voa no trenó.

E levam os varais

farolzinho elétrico.

Eh, arre, arre!

Leva um capacetinho roto de soldado,

a sua cara é tolo de todo em todo, de parvo.

Alisa-se, alisa-se o seu negro bigode;

alisa e recreia,

brinca.

Eis a Vanhka, o dos ombros de carrega.

Eis a Vanhka, o dos contos longos.

Abraça sua Katka, a muito paspalha,

a engana…

Ela a cabeça para atrás vai colocar,

e os seus dentinhos como perlas brilham…

Ai, Kátia, Kátia minha,

cara grossinha!

 

V

Ainda ao teu pescoço, Kátia,

tens de uma navalha o carimbo.

Abaixo de teu peito, Kátia,

ainda recente tens uma rabunhada.

Ei, ei, dança bem!

Que lindos são os teus pés!

Roupinha de encaixe levavas:

Põe-nas agora que eu as veja!

Com oficiais pavoneavas;

pavoneia, agora, pavoneia!

Ei, ei, pavoneia!

De súbito, o coração volteia.

Lembras-te do oficial aquele?

Nada houve que o salvasse…

não lembras, má chispa, dele?

Ou não fica a tua memória clara?

Ei, ei, faze-a mais clara!

Deita-te com ele, juntai a cara!

Levavas polainas e anéis nas orelhas,

engolias chocolate afamado.

Ias passear com os cadetes,

agora passeias com os soldados?

Ei, ei, peca sem calma,

será um alívio para a tua alma!

 

VI

…Voando, achega-se o cocheiro à dianteira.

Voa, uiva, grita…

Alto! Alto! Marela, ajuda, não te escondas.

Por trás, Loira, corre!

Tra-ta-ta-ta-ta!

Poeirinha de neve para o céu vai.

Vanhka quer fugir com o cocheiro…

Ergue mais outra vez teu gatilho ligeiro!

Tra-ta-ta-ta! Havemos nós de te ensinar

para onde te leva com a rapaza de outros andar a farrear…

Fugiu o canalha! Já hás ver, eu te digo,

como amanhã acabarei contigo.

Aonde está Kátia? Morta, morta a deixou.

A sua cabeça uma bala atravessou!

Contente, Kátia? Cala, cala, nada se move!…

Fica, como carronha, acá, sobre a neve!

Mais forte, teu passo, revolucionário,

que está o inimigo perto e temerário!

 

VII

Mais outra vez vão os doze,

sobre os ombros portam fuzilitos.

E só ao desgraçado assassino

não se lhe enxerga a cara de contrito.

Mais rápido o arquejo,

os passos acelera ao afastar-se.

Um pano envolve ao pescoço.

Não pode sossegar-se.

  • Porquê, estás , camarada, assim aflito?
  • Porquê, amiguinho, o medo te condena?
  • Porquê, Pedrinho, andas cabisbaixo?
  • É que Katka te dá lástima ou pena?
  • Meus bons camaradas destas horas!

Eu essa rapariga queria…

Noites embriagantes

passei junto dela noutros dias…

Pola força arrogante dos seus olhos

como de lume feitos;

por aquele lunar vermelho

junto ao seu ombro direito,

eu matei, homem fraco;

perdia-a num instante de despeito;

-Como nos maça este maldito!

Talvez, Pétia, és uma mulher?

  • É que desejas tirar tua alma num grito

para nos deixá-la ver?

      • Tua altivez mantém de soldadinho!
  • E dominar-te, isso é o que tens de fazer!
  • Não, não, é esta a hora

de mimos de babá,

porque uma carrega agora

mais grande, camarada, nos aguarda!

E já Pedrinho dá

mais lentos os seus passos…

A cabecinha eleva,

e mais outra vez alegra…

Ei, ei,

não é pecado mortal se é que se brica!

Fechai as casas,

que hoje há haver saques sem taxa!

Abri as adegas,

hoje brinca a gente inquieta!

 

VIII

Ai, tu, pena em cadeia,

nojo tenebroso

de morte!

Oh, que bem o tempinho

passarei, passarei eu!…

Oh, que bem a coroa

ranharei, cuspirei eu!…

Oh, que bem do girassol a casca

cuspirei, cuspirei eu!…

voa tu, burguês, como um pardalzinho!

Beberei sangue,

por essa amiguinha

de celhas negrinhas…

Requiescat in pace, a alma, Senhor, da tua serva…

Que nojo!

 

IX

Não se ouve ruido algum na cidade.

Um silêncio grave chegou sobre o Nevá.

Nenhum guarda há já.

Fazei brincadeiras, rapazes, e sem vinho!

Num entroncamento está o burguês;

o seu nariz no pescoço escondeu.

Um cão enreda-se lhe entre os pés,

sarnento, sujo, com o rabo caído.

O burguês silencioso e indecisso,

igual ao cão lá está,

e o velho mundo, como cão sarnento,

com o rabo caído está detrás.

X

A chúvia com neve põe-se furiosa.

Ai, tu, nevinha, nevinha!

A quatro passos não se enxergam as cousas,

tornam-se ariscas.

A neve brada em forma de garganta.

A neve em colunas se levanta.

-Ah, meu Deus, que forte é a nevada!

  • Pedrinho, em que parvadas atolas!

    De que te salvaram

    o altar dourado?

    Que pouco sentido também;

    pensa, mira-o bem,

    é que sangue não tens nas mãos frias

    por amor que a Katka tinhas?

    Mais firme o teu passo, revolucionário,

    que está o inimigo perto e temerário!

    Avante, avante, avante o fragor,

    povo trabalhador!

 

XI


… E sem nengum nome sagrado,
os doze avante a continuar.
Estão dispostos a tudo,
sem nada lamentar…

Os seus fuzis de aceiro apontam
contra o inimigo que não se vê…
por ruelas escuras,
onde a neve cai feroz…
E da neve mole
não podem as botas sair…

A bandeira vermelha
os olhos lhes fustiga.

Ouvem-se
ritmados os seus passos.


A qualquer momento pode despertar
o cruel inimigo.

E a neve caía nos olhos
dias e noites
sem parar…

Avante, avante,
povo trabalhador!

 

XII

E vão a frente com seguro passo…

  • Há alguém aí? Que se apresente!

Não, apenas o vento que joga no raso

da vermelha bandeira que lhes dá na frente…

A frente se ergue um monte de neve,

-Há alguém nele? Que se apresente!

Só um cão mendigo e faminto se atreve

a ir, rengueando, detrás da gente…

-Detrás não nos sigas, cadelo sarnento,

com a baioneta hei de te fazer rir.

E tu, velho mundo, cão piolhoso,

afunde, ou eu mesmo vou te desfazer!

…Ensina os dentes como lobo faminto;

não queres deixar-nos, o rabo caído,

cão vagabundo, perro friolento.

-Ei, contesta pronto! Quem vai? Ouviste?

-Quem move a frente a bandeira vermelha?

-Olha entre as sombras, seguro alguém passa.

-Quem anda que os passos, ao cruzar, afrouxa

e quer se ocultar por detrás das casas?

-Dá o mesmo o que haja, eu vou agarrá-lo.

-Melhor que te rendas, depois já veremos.

-Ei, ei, camarada, bem mal vás passá-lo;

sai ou começamos contra ti abrir fogo!

Tra-ta-ta-ta-ta! Só, só o eco

ressoa nas casas e de leve vai…

Só a trovoada com uivos secos

por entre a neve, gargalhadas dá.

Tra-ta-ta-ta,

tra-ta-ta-ta!

Com passo seguro assim vão sem pesar.

Seguindo as suas pegadas, um cão grande e bem listo.

E a frente deles com bandeira vermelha,

invisível na neve de alvores de asas,

imune às balas,

andando no ar com um passo leve,

levando um tesouro de perlas de neve,

coroa de rosas, que jamais se tem visto,

a frente deles, vai Jesus Cristo…

Janeiro, 1918

 

Двенадцать

 


1

Черный вечер.
Белый снег.
Ветер, ветер!
На ногах не стоит человек.
Ветер, ветер —
На всем божьем свете!

Завивает ветер
Белый снежок.
Под снежком — ледок.
Скользко, тяжко,
Всякий ходок
Скользит — ах, бедняжка!

От здания к зданию
Протянут канат.
На канате — плакат:
«Вся власть Учредительному Собранию!»
Старушка убивается — плачет,
Никак не поймет, что значит,
На что такой плакат,
Такой огромный лоскут?
Сколько бы вышло портянок для ребят,
А всякий — раздет, разут…

Старушка, как курица,
Кой-как перемотнулась через сугроб.
— Ох, Матушка-Заступница!
— Ох, большевики загонят в гроб!

Ветер хлесткий!
Не отстает и мороз!
И буржуй на перекрестке
В воротник упрятал нос.

А это кто? — Длинные волосы
И говорит вполголоса:
— Предатели!
— Погибла Россия!
Должно быть, писатель —
Вития…

А вон и долгополый —
Сторонкой — за сугроб…
Что́ нынче невеселый,
Товарищ поп?

Помнишь, как бывало
Брюхом шел вперед,
И крестом сияло
Брюхо на народ?..

Вон барыня в каракуле
К другой подвернулась:
— Ужь мы плакали, плакали…
Поскользнулась
И — бац — растянулась!

Ай, ай!
Тяни, подымай!

Ветер веселый
И зол, и рад.
Крутит подолы,
Прохожих ко́сит,
Рвет, мнет и носит
Большой плакат:
«Вся власть Учредительному Собранию»…
И слова доносит:

…И у нас было собрание…
…Вот в этом здании…
…Обсудили —
Постановили:
На время — десять, на́ ночь — двадцать пять…
…И меньше — ни с кого не брать…
…Пойдем спать…

Поздний вечер.
Пустеет улица.
Один бродяга
Сутулится,
Да свищет ветер…

Эй, бедняга!
Подходи —
Поцелуемся…

Хлеба!
Что́ впереди?
Проходи!

Черное, черное небо.

Злоба, грустная злоба
Кипит в груди…
Черная злоба, святая злоба…

Товарищ! Гляди
В оба!

2

Гуляет ветер, порхает снег.
Идут двенадцать человек.

Винтовок черные ремни,
Кругом — огни, огни, огни…

В зубах — цыгарка, примят картуз,
На спину б надо бубновый туз!

Свобода, свобода,
Эх, эх, без креста!

Тра-та-та!

Холодно, товарищ, холодно!

— А Ванька с Катькой — в кабаке…
— У ей керенки есть в чулке!

— Ванюшка сам теперь богат…
— Был Ванька наш, а стал солдат!

— Ну, Ванька, сукин сын, буржуй,
Мою, попробуй, поцелуй!

Свобода, свобода,
Эх, эх, без креста!
Катька с Ванькой занята —
Чем, чем занята?..

Тра-та-та!

Кругом — огни, огни, огни…
Оплечь — ружейные ремни…

Революционный держите шаг!
Неугомонный не дремлет враг!

Товарищ, винтовку держи, не трусь!
Пальнем-ка пулей в Святую Русь —

В кондову́ю,
В избяну́ю,
В толстозадую!

Эх, эх, без креста!

3

Как пошли наши ребята
В красной гвардии служить —
В красной гвардии служить —
Буйну голову сложить!

Эх ты, горе-горькое,
Сладкое житье!
Рваное пальтишко,
Австрийское ружье!

Мы на го́ре всем буржуям
Мировой пожар раздуем,
Мировой пожар в крови —
Господи, благослови!

4

Снег крутит, лихач кричит,
Ванька с Катькою летит —
Елекстрический фонарик
На оглобельках…
Ах, ах, пади!..

Он в шинелишке солдатской
С физиономией дурацкой
Крутит, крутит черный ус,
Да покручивает,
Да пошучивает…

Вот так Ванька — он плечист!
Вот так Ванька — он речист!
Катьку-дуру обнимает,
Заговаривает…

Запрокинулась лицом,
Зубки блещут жемчуго́м…
Ах ты, Катя, моя Катя,
Толстоморденькая…

5

У тебя на шее, Катя,
Шрам не зажил от ножа.
У тебя под грудью, Катя,
Та царапина свежа!

Эх, эх, попляши!
Больно ножки хороши!

В кружевном белье ходила —
Походи-ка, походи!
С офицерами блудила —
Поблуди-ка, поблуди!

Эх, эх, поблуди!
Сердце ёкнуло в груди!

Помнишь, Катя, офицера —
Не ушел он от ножа…
Аль не вспомнила, холера?
Али память не свежа?

Эх, эх, освежи,
Спать с собою положи!

Гетры серые носила,
Шоколад Миньон жрала,
С юнкерьем гулять ходила —
С солдатьем теперь пошла?

Эх, эх, согреши!
Будет легче для души!

6

…Опять навстречу несется вскачь,
Летит, вопит, орет лихач…

Стой, стой! Андрюха, помогай!
Петруха, сзаду забегай!..

Трах-тарарах-тах-тах-тах-тах!
Вскрутился к небу снежный прах!..

Лихач — и с Ванькой — наутек…
Еще разок! Взводи курок!..

Трах-тарарах! Ты будешь знать,
. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
Как с девочкой чужой гулять!..

Утек, подлец! Ужо, постой,
Расправлюсь завтра я с тобой!

А Катька где? — Мертва, мертва!
Простреленная голова!

Что́, Катька, рада? — Ни гу-гу…
Лежи ты, падаль, на снегу!..

Революцьонный держите шаг!
Неугомонный не дремлет враг!

7

И опять идут двенадцать,
За плечами — ружьеца.
Лишь у бедного убийцы
Не видать совсем лица…

Всё быстрее и быстрее
Уторапливает шаг.
Замотал платок на шее —
Не оправиться никак…

— Что, товарищ, ты не весел?
— Что, дружок, оторопел?
— Что, Петруха, нос повесил,
Или Катьку пожалел?

— Ох, товарищи, родные,
Эту девку я любил…
Ночки черные, хмельные
С этой девкой проводил…

— Из-за удали бедовой
В огневых ее очах,
Из-за родинки пунцовой
Возле правого плеча,
Загубил я, бестолковый,
Загубил я сгоряча… ах!

— Ишь, стервец, завел шарманку,
Что ты, Петька, баба, что ль?
— Верно, душу наизнанку
Вздумал вывернуть? Изволь!
— Поддержи свою осанку!
— Над собой держи контроль!

— Не такое нынче время,
Чтобы нянчиться с тобой!
Потяжеле будет бремя
Нам, товарищ дорогой!

— И Петруха замедляет
Торопливые шаги…

Он головку вскидава́ет,
Он опять повеселел…

Эх, эх!
Позабавиться не грех!

Запирайте етажи,
Нынче будут грабежи!

Отмыкайте погреба —
Гуляет нынче голытьба!

8

Ох ты, горе-горькое!
Скука скучная,
Смертная!

Ужь я времячко
Проведу, проведу…

Ужь я темячко
Почешу, почешу…

Ужь я семячки
Полущу, полущу…

Ужь я ножичком
Полосну, полосну!..

Ты лети, буржуй, воробышком!
Выпью кровушку
За зазнобушку,
Чернобровушку…
Упокой, господи, душу рабы твоея…

Скучно!

9

Не слышно шуму городского,
Над невской башней тишина,
И больше нет городового —
Гуляй, ребята, без вина!

Стоит буржуй на перекрестке
И в воротник упрятал нос.
А рядом жмется шерстью жесткой
Поджавший хвост паршивый пес.

Стоит буржуй, как пес голодный,
Стоит безмолвный, как вопрос.
И старый мир, как пес безродный,
Стоит за ним, поджавши хвост.

10

Разыгралась чтой-то вьюга,
Ой, вьюга́, ой, вьюга́!
Не видать совсем друг друга
За четыре за шага!

Снег воронкой завился,
Снег столбушкой поднялся…

— Ох, пурга какая, спасе!
— Петька! Эй, не завирайся!
От чего тебя упас
Золотой иконостас?
Бессознательный ты, право,
Рассуди, подумай здраво —
Али руки не в крови
Из-за Катькиной любви?
— Шаг держи революцьонный!
Близок враг неугомонный!

Вперед, вперед, вперед,
Рабочий народ!

11

…И идут без имени святого
Все двенадцать — вдаль.
Ко всему готовы,
Ничего не жаль…

Их винтовочки стальные
На незримого врага…
В переулочки глухие,
Где одна пылит пурга…
Да в сугробы пуховые —
Не утянешь сапога…

В очи бьется
Красный флаг.

Раздается
Мерный шаг.

Вот — проснется
Лютый враг…

И вьюга́ пылит им в очи
Дни и ночи
Напролет…

Вперед, вперед,
Рабочий народ!

12

…Вдаль идут державным шагом…
— Кто еще там? Выходи!
Это — ветер с красным флагом
Разыгрался впереди…

Впереди — сугроб холодный,
— Кто в сугробе — выходи!..
Только нищий пес голодный
Ковыляет позади…

— Отвяжись ты, шелудивый,
Я штыком пощекочу!
Старый мир, как пес паршивый,
Провались — поколочу!

…Скалит зубы — волк голодный —
Хвост поджал — не отстает —
Пес холодный — пес безродный…
— Эй, откликнись, кто идет?

— Кто там машет красным флагом?
— Приглядись-ка, эка тьма!
— Кто там ходит беглым шагом,
Хоронясь за все дома?

— Все равно, тебя добуду,
Лучше сдайся мне живьем!
— Эй, товарищ, будет худо,
Выходи, стрелять начнем!

Трах-тах-тах! — И только эхо
Откликается в домах…
Только вьюга долгим смехом
Заливается в снегах…

Трах-тах-тах!
Трах-тах-тах…

…Так идут державным шагом,
Позади — голодный пес,
Впереди — с кровавым флагом,
И за вьюгой, невидим,
И от пули невредим,
Нежной поступью надвьюжной,
Снежной россыпью жемчужной,
В белом венчике из роз —
Впереди — Исус Христос.

Январь 1918

 

 

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CRISTO NO MONTE DAS OLVEIRAS de Gérard De Nerval (5)

CRISTO NO MONTE DAS OLVEIRAS de Gérard De Nerval (5)

DAS MINHAS TRADUÇÕES
TRADUÇÃO DO QUINTO E ÚLTIMO SONETO DE “CRISTO NO MONTE DAS OLIVEIRAS” DE GÉRARD DE NERVAL

V

Era ele o louco, o sublime enagenado…

O esquecido Ícaro que aos céus se aproxima,

O Fáeton perdido polos deuses tocado,

Este belo Atis que Cibeles reanima!

 

O augure escrutava o costado da vitima,

Com seu sangue embriagava a terra em paroxismo…

O universo todo sobre os eixos pendia

E o Olimpo um instante vacilou para o abismo.

 

«Respondei! Gritou César a Júpiter Amom,

Quem é este novo deus que se impõe sobre a terra?

E se não é um deus, acaso uma maldição…»

 

Mas o oráculo invocado o auspicio encerra;

Só ele explicar pode a misteriosa chama:

Aquele que deu sua alma polos filhos da lama.

 

 

[Tradução segundo a edição de Les Chimères de Michel Lévy frères, 1856]

V

C’était bien lui, ce fou, cet insensé sublime…

Cet Icare oublié qui remontait les cieux,

Ce Phaéton perdu sous la foudre des dieux,

Ce bel Atys meurtri que Cybèle ranime!

 

L’augure interrogeait le flanc de la victime,

La terre s’enivrait de ce sang précieux…

L’univers étourdi penchait sur ses essieux,

Et l’Olympe un instant chancela vers l’abîme.

 

“Réponds! criait César à Jupiter Ammon,

Quel est ce nouveau dieu qu’on impose à la terre?

Et si ce n’est un dieu, c’est au moins un démon…”

 

Mais l’oracle invoqué pour jamais dut se taire;

Un seul pouvait au monde expliquer ce mystère:

-Celui qui donna l’âme aux enfants du llllimon.

 

CRISTO NO MONTE DAS OLIVEIRAS. ÓLEO SOBRE TELA DE ANTON RAPHAEL MENGS (1769) 185 x 185 cm.

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