por Andre da Ponte | May 5, 2017 | Autores/as, Creación
Não quero já a alegria
que não seja prendada por teus olhos,
nem o prazer do vento,
nem o sabor da lua,
nem o dourado trigo em seu orgulho.
As ervas olorosas,
a música pausada dum violino,
as doces senhardades
que o castanheiro cede,
são pequenas cousinhas ao teu passo.
Hoje o meu coração está brilhante,
e canta a cotovia
na frescura do ninho.
O destino que o caminhar compassa
são as luzes de amor ao teu cuidado.
Minha alma não ousa ficar sozinha
sem vibrar no teu sangue,
sem música aos teus lábios,
sem firme ar sereno
aberto par em par a tua ansiedade.
É por ti. Tão só a ti que procurava.
Ó cálido tremor! Ó fugitivo
bálsamo de candores,
eterna maravilha,
loura matéria banhada em seiva!
Quebrando a sua medida,
cercado íntimo lume
de pertinaz constância,
consolarão, para além da carícia,
a pura liberdade sempre aberta.
Coração duma fatiga
em ti se a apaga a sede, minha amada,
e aperto estreitamente
o calor que te cerca e te possui,
a paixão que levanta.
A minha mocidade como chanta
fica e todo o devora;
Mais outra vez na cinza
que exige lume e alimento,
arrumarão os dias.
E assim, amor do meu amor constante,
quando a sombra apague a luz dos rigores,
e os valados sejam meus firmes cimos,
quando o peso do tempo te possua,
serei tua luz mais cheia.
(Do livro inédito: “Sonata dum quebrado violino”)
*Imaxe: http://1.bp.blogspot.com/_h5WxwczlRKs/TOL6qvmfYbI/AAAAAAAAAE0/EK9xo83R8dE/s1600/natureza-na-mao-73445.jpg
por Andre da Ponte | May 3, 2017 | Autores/as, Creación
Hoje volto a vós, campos dolorosos,
órfãos já de trinados e de pegas,
nas lembranças que vão andando às cegas,
nos trêmulos vapores vagorosos,
nas brêtemas bronzeadas de opalino,
nas pegadas dos corços temerosos
que bebem luz do céu diamantino.
Torno a lembrar-te, campo desolado,
a voltar ao curso daquelas horas.
Torno a ti com as plácidas auroras
ao recendo do tempo constelado.
Volto a ti e em silêncio te interrogo
se te lembras daquele tempo passado
ardendo ainda labaredas de fogo.
É do teu colo, ó terra, que vivemos
nosso pesado pranto com porfias
e das mãos tiramo-nos com agonias
o pão de pesadume que comemos;
Ainda ontem carne de ásperos ossários
que corre polo sangue e que mantemos
na olhada dos carvalhos centenários.
Que acaso em que brotou a maravilha
da fermosura aberta que comove
– coalhado tempo que na alma chove –
bate em nós com rigor e acovilha?
Zoscado coração pendente à morte
sempre a brincar em trágica partilha
jogando-nos a nós em cruel sorte.
Aquele cômbaro dondo em verdores
sempre prendido às pedras derrotadas,
aqueles sucos nas lindes cansadas,
aquelas murchas e pálidas flores,
as árvores onde brigaram gumes,
os caminhos contemplando os rigores
de labirintos de carros e estrumes.
É no equilíbrio da gris cinza e da erva
que abala o miolo de afastados ossos.
Indago em ti com olhos pressurosos
a benigna paz onde o amor se enerva.
Melancolia acesa na procura
da mais longa caminhada proterva
que busco deter eu, mas me perfura.
Sobre ti cravarei a dor inerte
desta soidade que juntada alcança.
Lhe darei um voo prendido na esperança,
raízes de quentura para ter-te,
pedaços dum amor engravidado,
monte de lágrimas que na alma aperte
esse tempo feliz atravessado.
(Do livro inédito: “Sonata dum quebrado violino”)
FOTO: Presa de Merra de abaixo. San Salvador de Parga.
AUTOR: Raul Rio
por Andre da Ponte | Abr 30, 2017 | Autores/as, Creación
#SalvemosACasadeDiazCastro
#ACasadaXente
Meus muito queridos amigos,
há anos, já vão alá muitos anos, que escrevi este soneto do que me orgulho, pois penso que é dos mais belos e sentidos que já escrevi nunca.
Espero desculpeis a minha vaidade, mas também é uma homenagem a dous amigos, dous artistas muito queridos e dous vilaregos de pró.
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
NO PASAMENTO DE DIAZ CASTRO
“E um cão que ficava deitado, ergeu a cabeça e as orelhas: era Argos, o cão do pacente Ulisses, a quem criara, ainda que dpois não usara dele porque tivo de partir para a sagrada Ilião”
(Homero)
…………………………………………………………………
Honor àquele que navegou os mares
para voltar à Pátria inesquecida
e envolto na saudade lentescida
nos trouxo a nau povoada de cantares.
Bogache junto a nós para nos dares
nimbos de luz, e agora, na partida,
fica um recendo a erva florecida,
Ulisses Diaz Castro dos Vilares.
Por Vilarinho a terra se outoniça
e bruam os bois longos letargos:
«Um passo adiante e outro atrás, Galiza»
Um dia hão voltar passos amargos
e bandeiras de Parga a Pastoriça
quando te reconheçamos. Como Argos.
:::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::::
NOTA
Raul Rio deu-me a má notícia do falecimento do grande poeta e eu escrevi este soneto em homenagem o dia de quarta-feira, 3 de Outubro de 1990.
por Andre da Ponte | Abr 28, 2017 | Autores/as, Creación
Além fonte dos choupos do sendeiro
ia a tarde descendo demorada
e o suave cheiro na encruzilhada
batia ainda no céu soalheiro.
De mãos dadas, o rumo era um certeiro
rebolar da alegre alma ensimesmada
no alabastro sem ondas, e a dourada
meiguice terna me fez sobranceiro.
……………………………………………………..
Amor de salvação no remoinho
em que banho as lembranças dolorosas
de uma tarde de esperança e elegia.
Ainda o tempo ter cruel caminho,
sinto hoje em mim o perfume das rosas
daquele instante em que ao nascer morria.
(Do livro inédito Sonata dum quebrado violino)
Pintura: Campo de Coles, Pontoise. Camille Pissarro, 1873
por Andre da Ponte | Abr 26, 2017 | Autores/as, Creación
Os teus olhos guardaram mansamente
o doce aroma onde dormiu a rosa
tingindo minha lágrima amorosa
de ausente bico no meu lábio ardente.
No teu silêncio amei docemente
o latejo em tua alma temerosa
e fechei, já para sempre, a ardorosa
ânsia dum suspiro docilmente.
E busco a sombra que ficou transida
perdida numa tarde adolescente
quando, por um momento, amei a vida.
É no rigor do vazio onde, ausente,
me devora a lembrança fenecida,
passada, mas ainda tão presente.
(Do livro inédito: “Sonata dum quebrado violino”)