EXALTAÇÃO

EXALTAÇÃO

Não quero já a alegria

que não seja prendada por teus olhos,

nem o prazer do vento,

nem o sabor da lua,

nem o dourado trigo em seu orgulho.

 

As ervas olorosas,

a música pausada dum violino,

as doces senhardades

que o castanheiro cede,

são pequenas cousinhas ao teu passo.

 

Hoje o meu coração está brilhante,

e canta a cotovia

na frescura do ninho.

O destino que o caminhar compassa

são as luzes de amor ao teu cuidado.

 

Minha alma não ousa ficar sozinha

sem vibrar no teu sangue,

sem música aos teus lábios,

sem firme ar sereno

aberto par em par a tua ansiedade.

 

É por ti. Tão só a ti que procurava.

Ó cálido tremor! Ó fugitivo

bálsamo de candores,

eterna maravilha,

loura matéria banhada em seiva!

 

Quebrando a sua medida,

cercado íntimo lume

de pertinaz constância,

consolarão, para além da carícia,

a pura liberdade sempre aberta.

 

Coração duma fatiga

em ti se a apaga a sede, minha amada,

e aperto estreitamente

o calor que te cerca e te possui,

a paixão que levanta.

 

A minha mocidade como chanta

fica e todo o devora;

Mais outra vez na cinza

que exige lume e alimento,

arrumarão os dias.

 

E assim, amor do meu amor constante,

quando a sombra apague a luz dos rigores,

e os valados sejam meus firmes cimos,

quando o peso do tempo te possua,

serei tua luz mais cheia.

 

(Do livro inédito: “Sonata dum quebrado violino”)

 

 

 

*Imaxe: http://1.bp.blogspot.com/_h5WxwczlRKs/TOL6qvmfYbI/AAAAAAAAAE0/EK9xo83R8dE/s1600/natureza-na-mao-73445.jpg

CANTO NA TERRA MÃE

CANTO NA TERRA MÃE

Hoje volto a vós, campos dolorosos,

órfãos já de trinados e de pegas,

nas lembranças que vão andando às cegas,

nos trêmulos vapores vagorosos,

nas brêtemas bronzeadas de opalino,

nas pegadas dos corços temerosos

que bebem luz do céu diamantino.

 

Torno a lembrar-te, campo desolado,

a voltar ao curso daquelas horas.

Torno a ti com as plácidas auroras

ao recendo do tempo constelado.

Volto a ti e em silêncio te interrogo

se te lembras daquele tempo passado

ardendo ainda labaredas de fogo.

 

É do teu colo, ó terra, que vivemos

nosso pesado pranto com porfias

e das mãos tiramo-nos com agonias

o pão de pesadume que comemos;

Ainda ontem carne de ásperos ossários

que corre polo sangue e que mantemos

na olhada dos carvalhos centenários.

 

Que acaso em que brotou a maravilha

da fermosura aberta que comove

– coalhado tempo que na alma chove –

bate em nós com rigor e acovilha?

Zoscado coração pendente à morte

sempre a brincar em trágica partilha

jogando-nos a nós em cruel sorte.

 

Aquele cômbaro dondo em verdores

sempre prendido às pedras derrotadas,

aqueles sucos nas lindes cansadas,

aquelas murchas e pálidas flores,

as árvores onde brigaram gumes,

os caminhos contemplando os rigores

de labirintos de carros e estrumes.

 

É no equilíbrio da gris cinza e da erva

que abala o miolo de afastados ossos.

Indago em ti com olhos pressurosos

a benigna paz onde o amor se enerva.

Melancolia acesa na procura

da mais longa caminhada proterva

que busco deter eu, mas me perfura.

 

Sobre ti cravarei a dor inerte

desta soidade que juntada alcança.

Lhe darei um voo prendido na esperança,

raízes de quentura para ter-te,

pedaços dum amor engravidado,

monte de lágrimas que na alma aperte

esse tempo feliz atravessado.

 

(Do livro inédito: “Sonata dum quebrado violino”)

 

 

FOTO: Presa de Merra de abaixo. San Salvador de Parga.

AUTOR: Raul Rio

ANDRÉ DA PONTE A DIAZ CASTRO

ANDRÉ DA PONTE A DIAZ CASTRO

#SalvemosACasadeDiazCastro

#ACasadaXente

Meus muito queridos amigos,

 há anos, já vão alá muitos anos, que escrevi este soneto do que me orgulho, pois penso que é dos mais belos e sentidos que já escrevi nunca.

 Espero desculpeis a minha vaidade, mas também é uma homenagem a dous amigos, dous artistas muito queridos e dous vilaregos de pró.

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 NO PASAMENTO DE DIAZ CASTRO

 “E um cão que ficava deitado, ergeu a cabeça e as orelhas: era Argos, o cão do pacente Ulisses, a quem criara, ainda que dpois não usara dele porque tivo de partir para a sagrada Ilião”

 (Homero)

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 Honor àquele que navegou os mares

para voltar à Pátria inesquecida

e envolto na saudade lentescida

nos trouxo a nau povoada de cantares.

Bogache junto a nós para nos dares

nimbos de luz, e agora, na partida,

fica um recendo a erva florecida,

Ulisses Diaz Castro dos Vilares.

Por Vilarinho a terra se outoniça

e bruam os bois longos letargos:

«Um passo adiante e outro atrás, Galiza»

Um dia hão voltar passos amargos

e bandeiras de Parga a Pastoriça

quando te reconheçamos. Como Argos.

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NOTA

 Raul Rio deu-me a má notícia do falecimento do grande poeta e eu escrevi este soneto em homenagem o dia de quarta-feira, 3 de Outubro de 1990.

PRIMEIRO AMOR

PRIMEIRO AMOR

Além fonte dos choupos do sendeiro

ia a tarde descendo demorada

e o suave cheiro na encruzilhada

batia ainda no céu soalheiro.

De mãos dadas, o rumo era um certeiro

rebolar da alegre alma ensimesmada

no alabastro sem ondas, e a dourada

meiguice terna me fez sobranceiro.

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Amor de salvação no remoinho

em que banho as lembranças dolorosas

de uma tarde de esperança e elegia.

Ainda o tempo ter cruel caminho,

sinto hoje em mim o perfume das rosas

daquele instante em que ao nascer morria.

(Do livro inédito Sonata dum quebrado violino)

Pintura: Campo de Coles, Pontoise.  Camille Pissarro, 1873

LEMBRANÇA DO AMOR

LEMBRANÇA DO AMOR

Os teus olhos guardaram mansamente

o doce aroma onde dormiu a rosa

tingindo minha lágrima amorosa

de ausente bico no meu lábio ardente.

No teu silêncio amei docemente

o latejo em tua alma temerosa

e fechei, já para sempre, a ardorosa

ânsia dum suspiro docilmente.

E busco a sombra que ficou transida

perdida numa tarde adolescente

quando, por um momento, amei a vida.

É no rigor do vazio onde, ausente,

me devora a lembrança fenecida,

passada, mas ainda tão presente.

(Do livro inédito: “Sonata dum quebrado violino”)