CANÇÃO SEM PALAVRAS

CANÇÃO SEM PALAVRAS

E eu que de tanto amá-la

nem sabia que a queria…

Cruel dor já só me resta

aprofundando na ferida…

E eu, que tanto a amava

e era então que não sabia….

E eu, que tanto a sonhei

como sonha a flor a água fina…

Como fervença em névoas passadas

desce quanto o recordo cria

e resta daquele pouso

uma saudade maldita…

(Como é que miravam seus olhos,

a sua fala, como recendia?

Qual foi a mão que abalou o vento

e deixa agora a tristeza prendida?

Como cheiravam os seus cabelos?

E a aflição infinita

bate como martelo na alma

onde só a soidade fica…)

Agora que já todo perdi,

ainda que as minhas mãos a perdê-la se resistam,

fica comigo dor,

pegada bem-querida.

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

https://presentepravoce.files.wordpress.com/2010/07/pegadas-na-areia.jpg

A ÚLTIMA CHAMADA POR TELEFONE

A ÚLTIMA CHAMADA POR TELEFONE

Foi o último alento, o postreiro fio

deixando em dor a vida atravessada.

Foi um adeus sem adeus duma chamada

naquele respirar distante e frio.

 

Percorre-me ainda o corpo um arrepio

se penso em tua voz encadeada

e sinto que era alegre a tua mirada

e sei bem que o meu um crime no vazio.

 

Regressa em mim, já fantasma e afastado

sem bicos para o lábio, aquele alento

e desse telefone o som colgado.

 

E maldigo sem fim esse momento

em que fui eu ruim tolo arrebatado,

néscio sem perdão e mais violento.

 

 

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

http://images.freeimages.com/images/previews/da7/phone-hang-up-2-1251478.jpg

RECANTOS DA MEMÓRIA

RECANTOS DA MEMÓRIA

Nos campos da soidade minha ferida

errante e sem consolo vai calada,

perseguindo a sombra duma pegada

que nutra e reconforte a minha vida.

 

A chama nas lembranças estendida

mantém ainda a esperança ousada

e amar resignado é a aguilhada

que punçoa a minha alma desprendida.

 

A luz da existência está extinta,

só aguardo que a tristeza vizinha

que rói, nutra a dor e não desminta

 

o tempo que se foi e ainda acarinha

a angústia de voltar. Não me minta

o recordo que junto a mim caminha…

 

 

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

http://www.ecoticias.com/userfiles/2016/Mar_28/RANAS14_33_original.jpg

MEDITAÇÃO

MEDITAÇÃO

Quem lhe há dar ao coração um só minuto

antes da mágoa soltar sem arte?

Quem certeza lhe há doar, que descarte

o tão severo passado absoluto?

 

Quem submeterá sem clamor nem luto

o seu fluir que de nengures parte?

Quem lhe referirá calado aparte

no teatro do mundo irresoluto?

 

Quem lhe restituirá sua ferida

já lindada no marco da paisagem?

Quem ousará sulcar a triste vida?

 

Bate a tua bágoa de estiagem

a sós, com quietude recolhida

da profunda azedume sem sondagem.

 

 

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

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DESTERRADO DESTINO

DESTERRADO DESTINO

Aqui, onde a triste sina me desterra,

contigo estou, amor, ainda sem ver-te.

Importa só, meu bem, o de querer-te,

que tudo o mais nada importa se se erra.

 

Sei que hei findar, e há me sobrar a terra

se na memória falha de perder-te,

eu bem seguro estou que haverei ter-te

guardada dentro da alma que te cerra..

 

Se possuo no cerne pensamento,

verá que a lembrança será adida

o que aos meus olhos já lhe estorva a sorte.

 

E assim que deste longo afastamento

só o teu recordo me guarde a vida,

porque não te lembrar já é eterna morte

 

 

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