ANTOLOGIA POESIA PALESTINA MODERNA (XVIII)

Samih al-Qassim

سميح القاسم

Discurso no mercado do desemprego


Talvez perda — se desejares — a minha subsistência,
talvez as minhas roupas e o meu colchão venda,
talvez trabalhe na canteira como carregador ou como varredor,

Talvez no esterco procure os grãos.
Talvez fique despido e faminto
mas não me venderei,
ó inimigo do sol!

Resistirei
até a última palpitação de minhas veias.
Talvez espolies a derradeira polegada da minha terra.
Talvez aprisiones a minha mocidade.
Talvez roubes a herança de meus avôs,
os móveis,

os utensílios

e as jarras.
Talvez queimes os meus versos e os meus livros.
Talvez atires meu corpo aos cães.
Talvez espantos de terror levantes sobre a nossa aldeia.
Ó inimigo do sol!

Mas não me venderei
e até a última pulsação de minhas veias
Resistirei.
Talvez apagues todas as luzes da minha noite.
Talvez me prives da ternura de minha mãe.
Talvez adulteres a minha história.
Talvez ponhas disfarces para enganar os meus amigos.
Talvez valados e muralhas eleves ao meu redor.
Talvez me crucifiques um dia diante de espectáculos indignos,
mas não me venderei,
ó inimigo do sol!,
e até a última pulsação de minhas veias
resistirei.
Ó inimigo do sol,
o porto transborda de beleza… e de signos,
dornas* e alegrias,
clamores e manifestações,
cantos patrióticos estalam nas gargantas
e no horizonte… há velas
que desafiam o vento… a tempestade e franqueiam os obstáculos.
É o retorno de Ulisses
do mar das privações,
o regresso do sol… de meu povo exilado
e para os seus olhos
ó inimigo do sol.
Juro que não me venderei
E até a última pulsação de minhas veias
resistirei.
Resistirei.
Resistirei.

 

 

 

Hei-no gritar

Enquanto me restem algumas polegadas da minha terra,
enquanto me reste uma oliveira,
uma laranjeira,
um pouco… um pequeno bosque de cactos,
enquanto me restem as lembranças,
uma pequena biblioteca,
a foto dum avô… uma muradelha,
entrementes restem ao meu país palavras árabes
e as cantigas do povo,
enquanto durem manuscritos dos meus poemas
e os contos de Antar al-Absi:
“as guerras do Chamado nas comarcas de Roma e Pérsia”,
enquanto me restem olhos,
livros,
mãos,
enquanto me restem alentos
hei-no gritar frente do inimigo.
Hei-no gritar. Declaração de guerra
em nome dos homens livres,
operários, estudantes, poetas,
hei-no gritar… e que os bandulhos frouxos
e os inimigos do sol
se fartem do pão da vergonha.
Enquanto me restem alentos,
e alimento me restará

a minha palavra será pão e arma
nas mãos dos guerrilheiros.

 

 

 

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