CODA

CODA

Cego ando por eu tanto ter chorado,

bágoas a centos tenho vertido,

não se admirem se em rios dividido

ou em mares não me tenha derramado.

 

Meu coração, aflito e aprisionado,

tem dor em si próprio guarnecido

e assim nos meus poemas tem sentido

o sofrimento onde fico barrado.

 

Eu, que conheci o amor e a fermosura,

permaneço já só com meu quebranto

e a prolongada infinita loucura.

 

Que finde o ousado livro com meu pranto

inundado por versos de tristura.

Feche-se aqui meu dolorido canto.

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

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CANÇÃO SEM PALAVRAS

CANÇÃO SEM PALAVRAS

E eu que de tanto amá-la

nem sabia que a queria…

Cruel dor já só me resta

aprofundando na ferida…

E eu, que tanto a amava

e era então que não sabia….

E eu, que tanto a sonhei

como sonha a flor a água fina…

Como fervença em névoas passadas

desce quanto o recordo cria

e resta daquele pouso

uma saudade maldita…

(Como é que miravam seus olhos,

a sua fala, como recendia?

Qual foi a mão que abalou o vento

e deixa agora a tristeza prendida?

Como cheiravam os seus cabelos?

E a aflição infinita

bate como martelo na alma

onde só a soidade fica…)

Agora que já todo perdi,

ainda que as minhas mãos a perdê-la se resistam,

fica comigo dor,

pegada bem-querida.

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

https://presentepravoce.files.wordpress.com/2010/07/pegadas-na-areia.jpg

A ÚLTIMA CHAMADA POR TELEFONE

A ÚLTIMA CHAMADA POR TELEFONE

Foi o último alento, o postreiro fio

deixando em dor a vida atravessada.

Foi um adeus sem adeus duma chamada

naquele respirar distante e frio.

 

Percorre-me ainda o corpo um arrepio

se penso em tua voz encadeada

e sinto que era alegre a tua mirada

e sei bem que o meu um crime no vazio.

 

Regressa em mim, já fantasma e afastado

sem bicos para o lábio, aquele alento

e desse telefone o som colgado.

 

E maldigo sem fim esse momento

em que fui eu ruim tolo arrebatado,

néscio sem perdão e mais violento.

 

 

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

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RECANTOS DA MEMÓRIA

RECANTOS DA MEMÓRIA

Nos campos da soidade minha ferida

errante e sem consolo vai calada,

perseguindo a sombra duma pegada

que nutra e reconforte a minha vida.

 

A chama nas lembranças estendida

mantém ainda a esperança ousada

e amar resignado é a aguilhada

que punçoa a minha alma desprendida.

 

A luz da existência está extinta,

só aguardo que a tristeza vizinha

que rói, nutra a dor e não desminta

 

o tempo que se foi e ainda acarinha

a angústia de voltar. Não me minta

o recordo que junto a mim caminha…

 

 

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

http://www.ecoticias.com/userfiles/2016/Mar_28/RANAS14_33_original.jpg

CARTA SEM ESPERAR RESPOSTA À AMADA INOMINADA

CARTA SEM ESPERAR RESPOSTA À AMADA INOMINADA

Por estes versos tristes que lhe escrevo,

filhos do meu amor ortografado,

saberá a minha pena e meu cuidado

e que nada deve e eu todo lhe devo.

 

Se meu engenho dá, já não me atrevo

escrever o que o coração estragado

sente em si, golpe a golpe, tão penado

que, calando, a minha pena descrevo.

 

Fora grande ventura perto ver-vos

e, depois de vista, disposto a amar-vos

resignado a ser dó sem merecer-vos.

 

Pois resulta impossível olvidar-vos,

saiba que são estes versos protervos

as tulhas da paixão para guardar-vos.

[Do livro inédito “Sonata dum quebrado violino”]

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